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Tentar invocar o amor em meio ao ódio é um erro.

  • Foto do escritor: Norma Melhorança
    Norma Melhorança
  • 17 de abr.
  • 2 min de leitura

Tentar invocar o amor em meio ao ódio é um erro — um equívoco profundamente humano, repetido por terapeutas e místicos, na tentativa de se alcançar o amor ao longo da história. Nos mitos, amor e ódio são apresentados como forças irmãs, nascidas do mesmo caos: Eros e Éris. E, como costuma acontecer, é o ódio que se manifesta primeiro.


Vivemos um tempo em que não basta mais apenas pregar o amor — é preciso experienciá-lo de forma autêntica, o que exige antes encarar e digerir o ódio que habita nossa psique. Em vez de continuarmos projetando esse ódio no outro, como a civilização tem feito sistematicamente, somos chamados agora a acolhê-lo dentro de nós.


Essa digestão emocional não se dá de maneira racional nem imediata. Não se trata de decidir amar para apagar o ódio, mas de permitir que ele venha à tona, que pulse e se revele por inteiro — até que, no tempo do coração e não da razão, algo novo possa emergir.


Essa transformação precisa acontecer dentro de nós. Assim como o corpo extrai dos alimentos aquilo que é essencial e elimina o que não serve, também precisamos processar afetivamente esse alimento emocional — agressivo, hostil, tóxico — encravado em nosso coração. Esse processo exige coragem e presença: a rara capacidade de permanecer com o incômodo, sem fugir dele, permitindo que o ódio pulse e se manifeste plenamente, sem a interferência do ego, apenas acolhendo-o no peito, no centro da nossa sensibilidade, o timo.


É nesse espaço interno que precisamos desenvolver o que o psicanalista Wilfred Bion chamou de “capacidade negativa” — a habilidade de sustentar a dúvida, o desconforto, o não saber, sem buscar respostas imediatas. Com essa disposição, o ódio pode, com o tempo, se transformar em algo diferente. Muitas vezes, essa transformação se manifesta como amor — mas não necessariamente. O importante é que, ao deixar de projetá-lo no outro, algo genuíno e menos contaminado possa finalmente fluir de dentro para fora. E talvez, então, o amor genuinamente possa surgir.


N/MundoPsi

 
 
 

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